terça-feira, 13 de março de 2012

Sobre Felicidade e Alegria


"[...]O que sei sobre a felicidade? O que dela experimentei. Ao longo destes anos vividos, muitas vezes eu reconheci que meu corpo estava visitado por uma satisfação diferente. Uma satisfação não brotada de motivos. Uma sensação que nascia sem que eu pudesse conhecer suas causas. Era como se a realidade imaterial se hospedasse em meu corpo, criando um estado de harmonia, que assim como vinha também partia. A breve passagem sempre funcionou como um indicativo de que estava no caminho certo.

Compreendo a felicidade dessa forma. Viver confortável em mim mesmo, e vez ou outra receber a confirmação que me vem pelas sensações. Reconheço minha felicidade escondida em pequenas coisas miúdas. São pequenas interferências que quebram o cotidiano e sua continuidade. Por um instante, a vida parece parar. O coração descobre um novo jeito de enxergar o sempre visto, o mundo que nunca muda, e nele encontra um motivo para sorrir ainda que a vida ande escassa de alegrias. Custa a gente aprender, mas nem sempre a felicidade estará de braços dados com a alegria. A alegria sobrevive de motivos externos. Felicidade não. É mais profunda. Não depende das alegrias para que seja real. É possível ser feliz mesmo quando não estejamos alegres. Em muitos momentos árduos da vida eu permanecia feliz. Por quê? Eu tinha certeza de que estava no lugar certo, fazendo a coisa certa.
A realização humana, raiz de toda felicidade, consiste em saber-se a pessoa certa no contexto das escolhas feitas. Encontrar conforto ainda que a vida esteja pesada, porque sabemos que estamos onde verdadeiramente deveríamos estar. É o sacrifício salutar. Reconhecer que, mesmo na ausência de alegrias, a felicidade permanece motivando a luta."

Trecho do Livro  "Tempo de Esperas" Editora Planeta - Pe. Fábio de Melo.

sábado, 10 de março de 2012

"Ela acreditava em anjos e, porque acreditava, eles existiam."
Clarice Lispector in A Hora da Estrela.



segunda-feira, 5 de março de 2012

Ouvindo Estrelas


"Ora (direis) ouvir estrelas! Certo 
Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto, 
Que, para ouvi-las, muita vez desperto 
E abro as janelas, pálido de espanto. 

E conversamos toda a noite, enquanto 
A Via Láctea, como um pálio aberto, 
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto, 
Inda as procuro pelo céu deserto. 

Direis agora: "Tresloucado amigo! 
Que conversas com elas? Que sentido 
Tem o que dizem, quando estão contigo?" 

E eu vos direi: "Amai para entendê-las! 
Pois só quem ama pode ter ouvido 
Capaz de ouvir e entender estrelas."

Via Láctea - Olavo Bilac





sexta-feira, 2 de março de 2012

Ruminação


Deixar-se à mercê do significado literal de mastigar.
Mastigar a vida.
Alimentar-se dela.
Mastigar os sentimentos.
Alimentar-se deles.
Mas de um jeito tão silencioso,
porque não deseja dividir a trilha sonora
com desconhecidos nada interessados em conhecer o "mais de dentro" do outro.
Ruminar somente com conhecidos de alma;
com aqueles que se permitem exorcizar tragédias pessoais.
Das pequenininhas às devastadoras.
E dos que riem do outro, mas sem ofender ao próximo.
Dos que fazem certo charme,
mas ficam por perto e confidenciam que, às vezes,
cultivam fetiche pela felicidade.
Ruminando lonjuras quando tudo o que se quer
– com o desespero dos silentes -
é aquele abraço.
Nenhum outro.
Nem ninguém.
E daí fazer bico,
chutar parede que é pra doer mais o dedo do pé do que a alma
Que deixou de querer ser amante da solidão enraizada.
E então de uma hora para outra,
deu-se conta de que depois de um tempo
- que nem dá pra contar -
o coração deixou a aridez de lado
e convidou a paixão pra dançar.
Matando a sede de viço.
De vida.
Dando de comer ao amor.
E às danças: pés descalços tocando o assoalho.