quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Preciso de pouco. Mas é um pouco que significa tanto, que não conseguiria mensurar. Não meço a quantidade, foco na qualidade. Quanto menos preciso, mais pareço ter. Existe uma satisfação nas pequenas coisas e um desprendimento nas que pareciam grandes até pouco tempo atrás.
Há tempos minha régua mudou.
Cada vez mais valorizo pessoas, vou aos poucos esquecendo o valor das coisas. As portas se batem e saio por aí abrindo janelas. As paisagens hoje são mais revigorantes do que as recompensas.


sábado, 20 de dezembro de 2014

Mesmo quando a boca cala




"Foi você me olhar de lado
E eu ao lado doido para confessar
Mesmo quando a boca cala, o corpo quer falar
Esses gestos incompletos,
Olhos tão repletos de te desejar
O direito de ir e vir, o desejo de ficar
Tudo isso pra dizer que eu não sei dizer
Onde é que isso vai dar
Que eu não mando no querer, aliás, é o querer que quer me governar
Hoje eu vivo pra dizer, eu digo pra viver,
Você é o meu lugar
Se o amor não nos quiser, então azar do amor, não soube nos amar..."





quinta-feira, 26 de junho de 2014









Ficou na memória dos meus olhos o clarão do sorriso dos seus.
Depois disso, tudo o que sorri pra mim com algum sol faz eu lembrar de você.





quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Inventário do Ir-remediável

"(...)

Não vou perguntar por que você voltou, acho que nem mesmo você sabe, e se eu perguntasse você se sentiria obrigado a responder, e respondendo daria uma explicação que nem mesmo você sabe qual é. Não há explicação, compreende? Eu também não queria perguntar, pensei que só no silêncio fosse possível construir uma compreensão, mas não é, sei que não é, você também sabe, pelo menos por enquanto, talvez não se tenha ainda atingido o ponto em que um silêncio basta? É preciso encher o vazio de palavras, ainda que seja tudo incompreensão? Só vou perguntar por que você se foi, se sabia que haveria uma distância, e que na distância a gente perde ou esquece tudo aquilo que construiu junto. E esquece sabendo que está esquecendo.

(...)

O tempo colocou na testa uma ruga que antes não havia.
De repente sinto medo. Um medo antigo, o mesmo que sentia o menino escondido embaixo da escada, esperando castigos. Um medo e um frio que nascem de alguma zona escondida no cérebro, nas lembranças, nas coisas que o tempo escondeu ao avançar, como se recuando súbito pusesse a descoberto todos os cantos invisíveis, todas as teias de aranha recobrindo velhos muros, os mesmos que tantas vezes tentei escalar sem que houvesse nada depois, nenhum caminho, nenhuma casa. Nada.

(...)

Mas se eu tivesse ficado, teria sido diferente? Melhor interromper o processo em meio: quando se conhece o fim, quando se sabe que doerá muito mais — por que ir em frente? Não há sentido: melhor escapar deixando uma lembrança qualquer, lenço esquecido numa gaveta, camisa jogada na cadeira, uma fotografia — qualquer coisa que depois de muito tempo a gente possa olhar e sorrir, mesmo sem saber por quê. Melhor do que não sobrar nada, e que esse nada seja áspero como um tempo perdido."


Caio Fernando Abreu

sexta-feira, 4 de outubro de 2013








Nos últimos dias, ao tempo em que a primavera chegava e o frio se despedia, as lembranças se acirraram. Não só (e propriamente) porque se aproxima a data em que parti para uma nova vida, mas, sobretudo, porque flores, cores e dias lindos de sol me dão a certeza de continuidade e permanência.

Na semana que passou, entre flores, saudades e raios de sol, andava à procura de algumas horas livres pra ler um bom livro, disparadamente (e para o estranhamento de muitos) minha maior diversão. 

Assim que a rotina permitiu, fugi pra um lugar tranquilo e comecei a devorar a nova obra de Leila Ferreira, cujo título, “Viver não dói”, me pareceu bem pertinente. Lá pelas tantas folhas, me deparei com algumas poucas palavras que, juntas, definem exatamente essa sensação de permanência, que nem a morte parece ser capaz de apagar. 

Está lá, na página 175 do livro, estampada com todas as letras: memória é “um lugar sagrado onde os sentimentos não têm data para existir e a nitidez das imagens costuma ser bem maior do que as fotografias”.

À definição perfeita de Leila, permito-me (humildemente) acrescentar que a memória é o que mantém incólume a nossa essência. E é, ainda, o que nos dá alguma certeza e segurança nessa vida. Porque, para além das mudanças e turbulências que o tempo invariavelmente traz, a memória está sempre ali, pronta a nos reportar ao lugar de onde viemos, àquilo que realmente somos. Nos dias em que o chão nos falta, é ela quem, gentilmente, nos leva de volta pra casa.

sexta-feira, 3 de maio de 2013



Vai que você passe, arrastando seu passado escandaloso, recheado de tropeços e amores, arraigado em sorrisos e desaforos. Que dance a dança dos mistérios, e investigue a história dos soluços, alimente universos paralelos, e ameace o choro se ele acontecer sem consentimento.

Com sentimento...

Vai que você reze por medo, desbrave o mundo com elegância, desça do salto da esperança, só para encarar o derradeiro. Grite por ajuda ou brincadeira, gargalhe diante da fatalidade. Revire gavetas, procure tesouros escondidos em bocas alheias, venda paixões imaginárias a troco de nada e redenção. Que mude tudo de lugar só para garantir tropeço.

Caia aos pés dos recomeços.

Vai que você passe, exalando o perfume das tragédias, trançada em panos da comédia, fazendo-se de vítima da felicidade. Das obras tortas da felicidade. Da indecência da felicidade. Da sagacidade da felicidade. Da falta que faz a felicidade.

Quando ela se perde da gente.

Vai que você cometa crime, mate o dó e o ressuscite lágrima, deságue mares no chão da sala, assista chuva cair nos telhados. Deite-se no chão para alcançar o céu, varra a casa para pagar o aluguel do tempo gasto com nada. Colha segredos dos que lhe dão confiança. Cozinhe a comida para a fome das crianças que não teve, more em varandas, em quintais, em cativeiros.

Em prisões que lhe provocam medo.

Vai que você quebre a banca, as regras, a cara amarrada de quem lhe fere. Fale com o espelho sobre a imagem de quem ama. Negue ao espelho a imagem que lhe cabe. Core diante da palavra afeto, sonhe secretamente com a palavra alento, refestele-se na palavra vento. Engula palavras em verso, cuspindo-as em ritmo de tantra.

Assanhando o consentimento...

Que lhe conceda o direito de habitar meus pensamentos, de abraçar meu coração com as mãos, criar silêncios no meu dentro. Tecer a si na minha memória. Fechar a casa e ir embora.

Deixando-me a ver navios e horas... Que não passam. 







segunda-feira, 22 de abril de 2013


O que eu quero tem dias que é distante. É um mistério desvendado e outro adquirido, uma conspiração de desaforos do destino. Há quem diga que o que eu quero mora em outro mundo, e que às vezes até consigo transitar entre este e aquele universo, como se fosse um fantasma procurando abrigo.


Não se iluda! Haverá sempre alguém para lhe apontar o dedo e dizer que o que você quer é um despropósito, porque merecimento não é coisa para qualquer um feito você. Mesmo sem a menor noção do que você deseja, esse alguém desfiará um rosário de porquês para explicar que você não merece essa oferenda.

A oferenda do destino.

A oferenda doce e benevolente.

A oferenda que é o prazer de conseguir o que se quer, mesmo que em uma versão diferente do imaginado.

Sorte minha que não nasci com medo de dedos em riste e previsões que não agradam nem mesmo ao meu paladar mais criativo. E não me aborrece escutá-los dizendo as mesmas frases feitas de quem tem medo de querer. Porque o que eu quero é muito mais profundo que o medo que a maioria enfeita com uma sabedoria falseada.

O que eu quero tem cheiro de terra depois da chuva, gosto da lágrima transitando da face à boca, de uma naturalidade que não pode ser interpretada nem mesmo pelos atores dignos de um Oscar. Tem gosto das pequenas loucuras cometidas em nome dos afetos, como roubar do jardim alheio uma flor objeto de próprios delírios, para enfeitar os cabelos com essa contravenção.

O que eu quero roça dedos na pele dos segredos, provoca arrepios e o nascimento de versos, a poesia expatriada pelo pudor. Passa noite em claro, tentando encontrar solução para a saudade. E usa e abusa da felicidade, sempre que possível, porque diferente do pensam uns e outros, o que eu quero se deleita com o entusiasmo pela vida.

O que eu quero tem dias de amarrotado, roto, sonso, desbotado, debochado até. Às vezes penso que cheguei ao momento catártico de largar mão de vez dessa querença. Só que é curta a duração desse hiato, é um assopro, um susto, uma palavra escondida no silêncio, brincando de cabra-cega com as desilusões. Depois recomeço... Quero.

O que eu quero tem dias que é louco, um antes de um depois futurista. É urgência regida pelo maestro das certezas vencidas. Indelével e multifacetado querer. O que eu quero é quando, onde, é um quem que corresponde, iniludivelmente, ao que me falta aos berros em um coração pra lá de desacostumado a esquecer.